sexta-feira, 31 de outubro de 2008

As minhas noites


É sempre desta hora até ao acordar
que mais dilacera e mói, arde e dói.
Como se a noite que eu soube amar,
pelo passado, me desse o que corrói.


Está frio, o corpo saindo ao inverno,
está escuro, o olhar ofuscado pela luz,
deixo a alma entregue neste inferno,
de não ter um sonho que me seduz.


Ingrata e injusta pelo que me dá
noite pérfida, que não sei apreciar.
Umas ali, outras além, ou hoje cá,
de nada sabe o que tenho para cear.


Só escrevo e apago infinitamente,
parece que nada se conjuga mais.
Adormeço cansado lentamente,
só, vagueio em sonhos irreais.


Acordo, iludido, procurando sem sentir,
não encontro companhia neste frio leito,
olho o vazio, e choro, onde queria sorrir
por te ver a dormir ao cobrir o teu peito.


Este gesto que repito pela noite fora,
que era automático e hoje demora,
leva-me ao, cada vez mais frio, acordar,
por não ter a meu lado quem queira amar.

Fim do dia

Sinto a pulsação, ... ora fraca... ora forte,
Como se em cada noite fossem revelados
os fantasmas do dia e a sua pobre sorte
de serem, em cada segundo, mal amados.


Sinto bater como se ritmo de música fosse,
como se variasse de som frenético a lento,
uma vezes amargo, outras mel, ou agri-doce,
como se fosse parar a qualquer momento.


Não, não me sinto bem e não me sinto mal,
se uma vezes fico a lembrar o doce pairar,
outras fico com uma fingida inércia mental,
e por fim choro, só sem ter quem abraçar.


E assim passo , horas de ir tarde sem ser tarde,
oiço, no vazio, o som cheio, que vagueia em mim.
Arrefeço a dor que ficou do fogo que não arde,
e penso... mais um dia que chegou ao fim.

quarta-feira, 22 de outubro de 2008

O mais doce amanhecer

Vagueaste, hoje, no meu sonho agitado.
Leve, como uma brisa na praia ao luar,
embrulhados num cobertor enrugado,
que aquecia o sonho imenso do nosso amar.


E dançavas, parada, partilhando o amanhecer,
onde sol nascia e a lua parecia querer dormir,
o mar e o rio misturavam-se sem se perceber,
e ao frio, abraçados, o calor fazía-nos sorrir.


Sonho de noite escura, pintada em tons claros,
sentados sonhávamos com o futuro que sorria,
partilhávamos segredos e gestos de amor raros,
naquele amanhecer bonito dessa saudosa baía.


Os barcos na faina, brilhavam como estrelas,
As ténues ondas cantavam para nos embalar.
A areia, o nosso ninho, tornava as palavras belas,
e as gaivotas planavam paradas no meu sonhar.


Fizemos juras e promessas, no sonho interrompido.
Desatámos o desejo, doce, preso na luz daquele luar.
Com estrelas formámos frases naquele momento querido,
È incomparável o sonho agitado de te ter e te amar.

Alma de Verdade

É amargo o sabor, do saber e sentir, da incapacidade.
Deixa-nos estarrecidos pela falta de compreensão.
E tudo o que se esvanece com o avanço da idade,
jamais sarará na ferida aberta e profunda no coração.

Porque, sem uma explicação, se vão palavras e gestos
em ventos de egoísmo, como se nada valesse a pena?
Talvez porque a alma só viva nos sonhadores lestos,
para quem a vida é amor e a felicidade sempre pequena.

Alma de verdade, pura, limpa, sincera, nunca emudecida.
Poderei até, um dia no fim da peça, calar-me e morrer,
mas levarei comigo a verdade de quem viveu numa vida,
a sinceridade de falar quando isso podia fazer perder.

E em verdade, limpa, rasgarei todos os mares impetuosos,
da doce ilusão da mentira, do calar, do partir sem explicar.
Pintarei no vazio, com sombras de nuvens e raios de luz saudosos
tudo o que para mim é o verdadeiro, puro e sincero amar.


"Sê descuidado no traje, se quiseres, mas conserva limpa a alma."
( Mark Twain )

Solidão

"Todo o inferno está contido nesta única palavra: solidão. "
(Victor Hugo)

Assim é... assim foi e até quando será?
Descendo a escadaria da ilusão inversa,
penso onde irei chegar, onde me levará
esta descida árdua, triste e perversa.
Ás vezes sem querer, Muitas sem perceber,
vou descendo porque se o céu é lá em cima,
o inferno fica lá em baixo onde tudo deve arder,
onde até um gesto, um olhar, esse fogo dizima.
Sigo só, degrau a degrau, desamparado.
Sem ter asas, palavras, mas levo a imagem.
Com fome de ter companhia para dormir descansado,
sigo, lastimoso, a minha derradeira viagem.