
É sempre desta hora até ao acordar
que mais dilacera e mói, arde e dói.
Como se a noite que eu soube amar,
pelo passado, me desse o que corrói.
Está frio, o corpo saindo ao inverno,
está escuro, o olhar ofuscado pela luz,
deixo a alma entregue neste inferno,
de não ter um sonho que me seduz.
Ingrata e injusta pelo que me dá
noite pérfida, que não sei apreciar.
Umas ali, outras além, ou hoje cá,
de nada sabe o que tenho para cear.
Só escrevo e apago infinitamente,
parece que nada se conjuga mais.
Adormeço cansado lentamente,
só, vagueio em sonhos irreais.
Acordo, iludido, procurando sem sentir,
não encontro companhia neste frio leito,
olho o vazio, e choro, onde queria sorrir
por te ver a dormir ao cobrir o teu peito.
Este gesto que repito pela noite fora,
que era automático e hoje demora,
leva-me ao, cada vez mais frio, acordar,
por não ter a meu lado quem queira amar.